O texto abaixo foi escrito por Joelma Xavier, aluna do curso de Dança Contemporânea, no dia 14 de dezembro de 2013.
CoNcReTa DaNçA
O experimentalismo da Poesia Concreta ganhou espaço, formas, cores, voz e movimento nas coreografias do Espetáculo 2013 do Curso de Dança Contemporânea da Escola do Corpo. A montagem contempla significativas (re)leituras de obras concretistas de diferentes autores (Décio Pignatari, Haroldo de Campos, Augusto de Campos, Ferreira Gullar, Paulo Leminski, Arnaldo Antunes).
O cenário, que é composto por um jogo cênico da expressão verbo-visual, parece colocar em movimento letras, palavras, formas geométricas, cores, além de “brincar” com dimensões de fundo e superfície, oferecendo um espaçamento tridimensional e, juntamente com as luzes, contribuindo para a interação com as experiências de linguagem em cena. O figurino traz recortes também geométricos e coloridos que fazem referências a obras de Mondrian e de Malevich, artistas de grande influência nas vanguardas europeias e no Modernismo.
As coreografias de Giovana Penna, Clarice Barboza, Gabriela Chiaretti, Regina Amaral e Lelena Lucas colocaram os bailarinos em ângulos variados, produzindo um interessante jogo de perspectivas e de movimentos que mesclaram poesia, precisão, ritmo e leveza em suas dimensões.
As montagens de Alicia Nascimento (Preparatório II e Intermediário) e a Perfomance com Maíra Brandão, dirigida por Fernando de Castro são surpreendentes, especialmente por potencializarem o caráter de inovação, de construção e de desconstrução da Poesia Concreta, não restrito à linguagem literária. As coreografias de Alicia Nascimento, por meio de composições acrobáticas, de deslizamentos velozes e de uma rica variação de movimentos, ocupam e esvaziam o palco de uma forma inteligente, permitindo-nos perceber o experimentalismo poético recriado na linguagem da dança. Nas duas coreografias, os bailarinos dirigidos por Alicia dão intensidade e potência ao que poderia “traduzir uma parte/na outra parte”, como indaga o eu-lírico do poema “Traduzir-se”, mote de uma das coreografias. Entretanto o que vemos não é uma tradução, mas uma criação de linguagem. E essa criação também é elaborada na performance de Fernando Castro. A bailarina e artista plástica Maíra Brandão “dança o desenho”, personifica a lua e a beleza exaltadas na canção de Caetano Veloso. A performance constrói-se como um movimento de artes em tensão: o desenho, na superfície branca, que ganha forma com a dança do carvão, com a circularidade dos movimentos ora longos, ora curtos que elaboram a forma e a não-forma; a construção e a desconstrução. Esse trabalho potencializa elementos estéticos do Concretismo que se manifestam no apelo cênico e estético de todo o conjunto dos movimentos, na inovação do desenho que dança ou na dança que desenha (não importa dar um conceito ou um nome para esse experimento), na riqueza dos movimentos circulares e na repetição das formas. É concretista também a experiência da desintegração, que parece dar a essa performance de Fernando de Castro um ar de protesto, um manifesto contra a arte pronta, a arte enquadrada, ou simplesmente fadada a olhares que a tornam limitada. Essas montagens de Alicia Nascimento e de Fernando Castro permitem-nos um retorno ao poema de Mallarmé, considerado o ponto de partida do Concretismo: “Un coup de dés jamais n’abolira le hasard”, um poema em que a comunicação não se faz no nível temático, mas na própria estrutura verbo-visual; no caso das montagens coreográficas, a comunicação na estrutura de múltiplas linguagens ou de múltiplas expressões de arte.
Parabéns a todos da Escola do Corpo. O trabalho de vocês é ARTE.
Joelma Xavier – 14/12/2013